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Doze anos após a morte da filha, hoje ela ajuda crianças com câncer…

Vivian Ortiz
Do VivaBem, em São Paulo
Originalmente postado no site: https://vivabem.uol.com.br/noticias/redacao/2018/04/04/apos-perder-a-filha-ela-virou-voluntaria-e-conta-como-superou-oo-luto.htm

Em 2006, a fonoaudióloga Joyce Andrade Setti, 56, viu a filha de 9 anos morrer em decorrência de um tumor. Como forma de superar a tragédia familiar, acabou virando voluntária em uma casa, em São Paulo, que hospeda famílias com crianças que estão passando por um tratamento contra o câncer. Ela contou a sua trajetória para o VivaBem:

“Tenho a honra de ser mãe de um anjo de verdade, pois tive o privilégio de conviver com a Heloísa durante seus quase 10 anos de vida. Faltava apenas uma semana para seu aniversário quando o desfecho de tudo aconteceu. A história toda foi bastante peculiar.

Tudo começou após uma indisposição noturna. Levei minha filha ao pediatra, que fez vários exames e não encontrou nada de errado. O problema foi que, no dia seguinte, ela acordou e não conseguia mais ficar em pé.

Ao ser internada e, após três dias de investigação, descobriram um tumor intramedular, que foi retirado em uma cirurgia. Deu tudo certo durante o procedimento, mas a Heloísa chegou a ficar sem movimentar as pernas durante seis dias, como sequela. Com a fisioterapia, ela recuperou os movimentos.

O tumor era benigno e, por isso, não foi preciso fazer quimioterapia. A vida voltou ao normal e ela até retornou para as aulas de balé, que amava. Fizemos um rígido acompanhamento durante os dez meses seguintes, mas o tumor reapareceu –desta vez, na região cervical. Isso foi um problema ainda maior, pois causou alteração de mobilidade do pescoço para baixo. Assim, foi necessário uma nova cirurgia, que durou nove horas e foi bem mais complicada do que a anterior.

A Heloísa perdeu os movimentos do pescoço para baixo, mas, novamente com a ajuda da fisioterapia, tudo foi voltando ao normal, inclusive as aulas de balé. Ela só não conseguiu voltar a andar de bicicleta, pois seu equilíbrio havia sido afetado.

Chegamos a fazer uma biópsia no exterior, que reafirmou que não era um tumor maligno, mas o médico achou melhor fazer quimioterapia dessa vez. Foi por via oral e não tinha nenhum efeito colateral, como perder o cabelo. Ela tomava a medicação durante quatro dias no mês. Isso foi em abril de 2006, quando minha filha já estava com nove anos.

Com o tratamento, as coisas se acalmaram novamente. Lembro que ela foi votar comigo nas eleições daquele ano. Ao chegar em casa, até pintamos a parede da sala em dupla.

Tudo estava tranquilo. Só que na segunda-feira acordei e percebi que ela estava tendo uma convulsão. Corremos para o hospital e descobrimos que o tumor havia chegado ao cérebro. E aí digo que a Heloísa me deu a despedida de presente, pois morreu apenas depois de ficar uma semana em coma.

Espalhando a luz

Óbvio que foi uma dor absurda, tanto para mim quanto para a minha família (Joyce também é mãe de dois meninos), mas penso que hoje sou uma pessoa absurdamente melhor do que era antes. E, se não tivesse passado por todas essas vivências, muito provavelmente não estaria fazendo o que faço atualmente, ajudando outras crianças.

Ela foi uma criança muito amada, com uma família que a supriu de muitas coisas, tanto emocionais quanto materiais. Parte das roupas da Heloísa foi para a casa Ronald McDonald de São Paulo (que hospeda famílias de crianças em tratamento contra o câncer e onde Joyce é gestora do voluntariado desde fevereiro de 2017, organizando e monitorar quem trabalha na casa de forma a aumentar sua motivação e atender cada vez mais aos objetivos propostos).

Tenho uma relação afetiva muito grande com a casa, pois me ajudou a visualizar toda essa experiência de uma forma diferente. Não fico pensando: “Por que eu?”. Claro que, em um primeiro momento, você fica em luto muito, se questiona um monte de coisas. Será que eu errei? Será que pequei aqui ou ali? Mas isso vai se acomodando…

Dizer que a dor passa com o tempo é mentira, mas você acaba aprendendo a viver com nova realidade.

Tenho o meu anjo particular. Ela teve uma breve passagem, mas muito intensa e que me deixou muitas sementes. E minha obrigação é fazer isso seguir.”

A DOENÇA DE HELOÍSA

Nasjla Saba Silva, oncologista pediátrica do Hospital do GRAACC –e uma das médicas do caso da filha de Joyce– conta que a história da menina foi bastante peculiar, pois o que ela teve foi um astrocitoma de baixo grau de malignidade com comportamento agressivo, recidivando duas vezes no local primário (medula torácica/cervical) e depois disseminando para o cérebro, apesar do tratamento.

De acordo com a especialista, alguns astrocitomas podem apresentar comportamento maligno por um erro molecular que leva esse tumor a apresentar alto grau de malignidade. “Em 2006, quando ela foi diagnosticada, não existiam recursos necessários para identificar essa agressividade. O tumor dela representava o grau II da classificação de agressividade. Hoje já sabemos que alguns tumores de baixo grau podem ter esse tipo de comportamento”, explica.

 

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